O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta terça-feira (9) o julgamento do “núcleo crucial” da suposta trama golpista com sinalizações do caminho que os cinco ministros da Primeira Turma deverão adotar em seus votos. Ao longo dos últimos meses, manifestações, questionamentos e decisões dos magistrados indicaram um provável consenso sobre condenações, mas também possíveis divergências que devem permear o debate no plenário da Corte.
O primeiro voto será do relator, ministro Alexandre de Moraes, que na semana passada abriu o julgamento com um duro discurso contra a possibilidade de “impunidade” a tentativas de golpe de Estado. Sua atuação ao longo dos últimos anos à frente de processos como os do 8 de Janeiro e o inquérito das fake news o colocam como figura central do combate ao golpismo e elevaram as expectativas sobre sua manifestação na sessão desta terça. Quem acompanha sua trajetória prevê um voto histórico, sustentado por uma retórica de defesa da democracia e das instituições.
“Golpe mata”
As penas impostas por Moraes aos chamados executores e incitadores do 8 de Janeiro tem chegado até a 17 anos de prisão, indicando que ele pode adotar punições ainda maiores para os réus acusados de liderar o movimento golpista. O magistrado justifica que as punições precisam ser “exemplares” a fim de coibir novas conspirações.
Entre os integrantes da Primeira Turma, Flávio Dino e Cármen Lúcia são os que mais têm acompanhado os entendimentos de Moraes até aqui, votando com o relator em todos os momentos dos processos. De medidas cautelares às penas impostas aos condenados do 8 de Janeiro, os dois nunca chegaram a apresentar uma divergência.
A exemplo de Moraes, Dino, que será o segundo a votar, tem adotado um tom enfático contra os ataques antidemocráticos. Na sessão que tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete integrantes do governo passado réus, e maio, ele rebateu a tentativa de minimizar a gravidade da trama ao dizer que “golpe de Estado” mata:
“É uma desonra à memória nacional minimizar uma tentativa de golpe porque não houve mortos. No dia 1º de abril de 1964 também não morreu ninguém. Mas centenas e milhares morreram depois. Golpe de Estado mata. Não importa se isso é no dia, no mês seguinte ou alguns anos depois.”
A expectativa de advogados dos réus é que as divergências no julgamento comecem a aparecer a partir do terceiro voto, de Luiz Fux. Embora tenha acompanhado o relator nas condenações de réus do 8 de Janeiro, o ministro tem se colocado como contraponto a Moraes em alguns tópicos, especialmente no que diz respeito à fixação de penas e à validade da colaboração premiada do ex-ajudante de ordens Mauro Cid.
O ministro também já fez ressalvas sobre a delação de Cid e deixou em aberto a possibilidade de votar para invalidar o acordo. No recebimento da denúncia, em março, Fux questionou os sucessivos depoimentos prestados pelo ex-ajudante de ordens, alguns com mudança de versão. Na terça-feira, voltou ao assunto ao perguntar à defesa do militar sobre sua voluntariedade em fazer a delação.
“O senhor está me dizendo que ele foi fazer uma colaboração na primeira oportunidade, mas depois ele não foi fazer, ele era chamado (para depor), é isso?”, questionou ao advogado do delator.
A postura divergente de Fux também ficou clara em decisões anteriores: foi o único a votar contra a imposição de medidas cautelares a Bolsonaro, como uso de tornozeleira eletrônica. E, no caso envolvendo a cabeleireira Débora Rodrigues, que pichou a estátua em frente ao STF no 8 de Janeiro, defendeu pena muito inferior à fixada por Moraes, Dino e Cármen Lúcia.
Decana da Turma e quarto voto no julgamento, Cármen, por sua vez, tem se colocado como guardiã das urnas eletrônicas ao longo do processo. Ela chegou a interromper um advogado na primeira sessão de julgamento, na terça-feira passada, para fazer uma reprimenda a respeito da segurança do sistema de votações.
Já na última quarta (3), a ministra questionou o advogado do ex-ministro Paulo Sérgio Nogueira após ele afirmar que seu cliente agiu para “demover” o ex-presidente. A pergunta foi interpretada como uma estratégia de Cármen para que o defensor admitisse a existência de um plano golpista.
“Vossa Senhoria disse que o réu ‘estava atuando para demover o presidente da República’. Demover de quê? Porque, até agora, todo mundo diz que ninguém pensou nada.”
O advogado Andrew Farias, representante de Nogueira, então, afirmou que a intenção de Bolsonaro era a de adotar “medidas de exceção” após a derrota eleitoral de 2022.
“Demover de adotar qualquer medida de exceção. (Nogueira) Atuou ativamente (para demover Bolsonaro)”, disse.
O último voto será de Cristiano Zanin, que é presidente da Turma. A exemplo de Fux, ele tem acompanhado Moraes nas condenações de réus, mas desde o primeiro caso diverge no cálculo das penas, a dosimetria. Seus votos são por penas alguns anos menores: quando o relator vota por 17 anos, por exemplo, ele defende 15; quando Moraes propõe 14 anos, Zanin vota por 11.
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